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O início da nossa história

Trecho do discurso proferido pelo Vice-Presidente da Fundação Hermínio Ometto, Sr. Fernando Fernandes Alvares Leite, na cerimônia de batismo do Prédio "Dr. Roberto Mercatelli", realizada dia 04 de agosto de 2018. Na ocasião, ele relatou brevemente a história que precede a criação da Fundação Regional de Ensino Superior em Araras, em 1973, como resultado dos esforços e aspirações de quatro representantes da sociedade ararense: Dr. Hermínio Ometto, empresário; Prof. Jair Della Coletta, na época prefeito da cidade e Dr. Roberto Mercatelli e Dr. Lauro Michielin, diretores da Clínica Psiquiátrica "Antônio Luiz Sayão".

No final da década de 1960 e início da de 1970, encontramos Araras vivendo um período áureo de sua história, no que diz respeito a materialização de ações voltadas ao bem comum. Nos anos finais da década de 1960, observamos o crescimento exponencial de uma importante entidade: o Sanatório "Antônio Luiz Sayão". Criado nos anos 1950 por iniciativa de um grupo de abnegados, sob a liderança do Dr. Roberto Mercatelli – todos vinculados ao Grupo Espírita Sayão, em 1969 o Sanatório vivia um período de sólida expansão: com 750 leitos voltados à caridade, já se configurava como um dos grandes hospitais filantrópicos do Brasil.

Na esteira da expansão de suas atividades na área da benemerência, assistimos à ampliação dos objetivos do Sanatório que, além daqueles específicos do segmento da saúde, passa a atuar também na esfera da assistência social. Assim, o "Lar Ismael", instituição filantróica ararense de amparo a menores carentes, fundada e mantida até então pela Maçonaria, por acordo entre as entidades, passa a ser gerido pelo Sanatório, que também cria internamente o Centro de Reabilitação e de Assistência a Menores, inclusive menores excepcionais.

E a expansão das atividades não se dá apenas na assistência social, mas também na educação, como um novo polo, necessário para absorver o projeto de criação de uma faculdade de medicina e de uma escola de enfermagem, extensões do segmento hospitalar da entidade.

O projeto educacional por eles elaborado se ampliou rapidamente para a idealização de uma universidade espírita, pioneira talvez no Brasil, mas com um forte componente bairrista: seria a universidade popular, filantrópica, da cidade de Araras, tão exaustivamente sonhada por todos os ararenses.

Dizia o sociólogo Paulo Freire: "Educação não muda o mundo. Educação muda as pessoas. Pessoas mudam o mundo". E assim, a educação passa também a constar dos ideais da entidade.

Nesse contexto, nasceu a Associação Pró-Universidade Espírita de Araras. Criada em 1969 tendo o Desembargador, Dr. Zalmino Zimmermann, como seu presidente, a associação, vinculada ao Sanatório, tinha por finalidade reunir esforços, atrair apoios, arrecadar fundos e estimular ações junto à comunidade, para viabilizar o projeto da universidade de Araras. Após a instituição das faculdades de medicina e enfermagem viriam outros cursos: filosofia, ciências econômicas e administrativas e os cursos de engenharia. Até mesmo a construção de um hospital-escola, no campus da universidade, estava prevista.

A faculdade de medicina tem sua diretoria nomeada, cabendo aos doutores Paulo Adolpho Teixeira, Hércio Marcos Cintra Arantes e Prof. Elídio Taveiros a condução das atividades da escola, e ao Dr. Lauro Michielin, a coordenação dos trabalhos do Departamento Pró Universidade Espírita do Sanatório. O corpo docente é formado, contando com profissionais oriundos de faculdades de medicina de Campinas, Ribeirão Preto e Uberaba. As instalações físicas são concluídas e a escola totalmente estruturada. Estatutos, estrutura orgânica interna; levantamento socioeconômico e sociocultural da região; programa de ensino da especialidade; laboratórios; necrotério; biblioteca; anfiteatros; convênios com hospitais; laboratório de análises clínicas; farmácia - todo o aparato técnico necessário ao funcionamento do primeiro curso da universidade, é disponibilizado em tempo hábil, com vista à obtenção das aprovações legais.

Tem início, então, a longa "via crucis" para obtenção do registro junto Conselho Federal de Educação e autorização de funcionamento pelo Ministério da Educação do Governo Federal. Os dirigentes do Sanatório, a todo tempo, enfatizavam a necessidade de vultuosos recursos para a implantação, consolidação e manutenção dos primeiros cursos, principalmente a viabilização da faculdade de medicina, e não desconheciam que o projeto poderia ser deficitário nos anos iniciais. Assim, a cada aquisição de um novo bem por parte da administração do Sanatório – um terreno, uma casa, uma gleba de terras – os diretores ressaltavam o propósito de resguardá-los para fazer frente a possíveis necessidades financeiras requeridas pelo novo projeto. A ata de reunião de diretoria de 02 de fevereiro de 1970 registra fala do Dr. Roberto Mercatelli, que justifica o imperativo de aumentar o patrimônio do Sanatório e viabilizar estudos de loteamentos para gerar receitas e suprir despesas crescentes, em vista da implantação da Universidade Espírita.

A comunidade ararense era constantemente informada, por meio dos jornais locais, das atividades da associação e manifestava vivo apoio à causa. Os artigos do Dr. Maximiliano Baruto e de outros – Dr. Ênio Vitali, inclusive – expunham os apoios recebidos, que vinham das empresas e instituições locais e, em especial, do Dr. Hermínio Ometto e de D. Duse Rüegger Ometto, que cedo se engajaram à causa.

Desse modo, no decorrer dos anos 1969 e seguintes, todos os atos relacionados à consolidação da universidade, à construção da cidade universitária, aos apoios materiais recebidos, às obras da primeira escola e as demandas junto ao Conselho Federal de Educação e Ministério da Educação e Cultura, eram divulgados pelo Jornal Tribuna do Povo e outros periódicos locais. Algumas manchetes da Tribuna:

"Araras poderá ter dentro em breve um conjunto de faculdades de Ensino Superior"
Empreendimento servirá uma região composta por 23 municípios
"Instalada a Associação Pró Universidade Espírita"
"Universidade sairá com ajuda de todos"
"Solenidade de doação de gleba para o Campus da Universidade Espírita"
D. Duse e Dr. Hermínio doam 15 alqueires de terra, destinados ao Campus da Instituição
"Expostos, oficialmente, os projetos completos do plano arquitetônico da Universidade Espírita de Araras"
"Cidade Universitária"
Iniciada a venda dos lotes
"Santa Casa – assinado convênio para utilização de 100 leitos na futura universidade"
"Expressivas doações para a Universidade Espírita de Araras"
Doações efetuadas pelo Dr. Horácio Sabino Coimbra, filho do Dr. Cesário Coimbra, e pela Loja Maçônica Fraternidade Ararense, que se somam as já efetuadas pelo Dr. Hermínio Ometto e senhora, Usina São João, Usina Palmeiras, Torque S/A e Usina Santa Lúcia.

Em 28 de fevereiro de 1971, em Assembleia Geral, os associados do Sanatório "Antônio Luiz Sayão" aprovaram a segunda etapa do projeto de consolidação da universidade. Estando cumprida a missão inicial de preparar e alicerçar as ações necessárias à materialização do empreendimento, a Associação Pró Universidade Espírita dá lugar à Associação Educacional, Hospitalar e Assistencial de Araras, entidade idealizada para ser a mantenedora definitiva da universidade que surgia. Sob a liderança do Dr. Lauro Michielin, os estatutos da Universidade Espírita de Araras são redigidos e aprovados – conselhos de administração, diretoria, departamentos, estrutura orgânica interna e regimentos; faculdades e cursos são estruturados e a dimensão do projeto se mostra por inteiro: não apenas uma universidade filantrópica voltada a um segmento restrito, o da saúde, mas uma universidade voltada aos interesses de todos, incluindo a educação e a assistência social.

No capítulo 3 dos estatutos aprovados, está expresso o objetivo da nova entidade: "A Associação Educacional, Hospitalar e Assistencial de Araras tem por objetivo criar, instalar e manter instituições hospitalares, assistenciais e criar, instalar e manter escolas e cursos de ensino, em todos os seus graus, estimular, por qualquer forma, a pesquisa e a investigação científicas exercendo, para isso, quaisquer atividades em prol da educação e da ciência".

A comunidade ararense continuou a ser informada, pela imprensa local, das atividades da associação. Podemos destacar algumas notícias daquela época – anos 1971 e 1972, veiculadas pela Tribuna do Povo:

"Inspecionada, pelo Ministério da Educação, a Faculdade de Medicina de Araras"
"Secretário Estadual de Saúde, Dr. Marcio Machado Lemos, advogará instalação da nossa Faculdade de Medicina"
"Ministro Jarbas Passarinho manifesta seu apoio à Faculdade de Medicina"
"Inesperada e simpática visita do Ilustre Governador"
Governador Laudo Natel e comitiva visitam as instalações da Faculdade de Medicina, do Campus Universitário e do Sanatório Antônio Luiz Sayão

Apesar das manifestações de apoio de autoridades e membros dos governos estadual e federal, os dirigentes do Sanatório passam a expressar preocupação com a demora da aprovação do empreendimento pelo Conselho Federal de Educação e com a não emissão da Autorização de Funcionamento pelo Ministério da Educação e Cultura. Visitas à capital federal são intensificadas e as dificuldades para a aprovação, a princípio veladas, vão se tornando expostas. A ata de reunião da diretoria do Sanatório, de março de 1972, registra o teor de uma dessas visitas, fato inclusive noticiado pelo Jornal Tribuna do Povo. Em setembro daquele ano, a Tribuna repercute matéria de jornal da capital, informando que nenhuma nova faculdade de medicina seria aberta no país, nos anos seguintes, à exceção das escolas de Bauru e Araras, afirmação feita pelo Ministro da Educação, Jarbas Passarinho, confirmando decisões do Governo Federal relativas ao ensino superior.

Um ano depois, ainda sem obter a esperada autorização do Ministério da Educação, o livro de registro de atas da Instituição assinala, em 02 de maio de 1973: "A faculdade de medicina pleiteada pelo Sanatório está cada vez mais difícil de ser conseguida. Há três anos que o Conselho Federal de Educação não autoriza o funcionamento de novas escolas dessa especialidade. Todos os nossos esforços materiais, políticos e outros, até agora, foram baldados".

Allan Kardec, dizia: "Quando o amor ao bem dirige os sentimentos e o pensamento, as ações, inegavelmente são certas e dignificadoras". Pois o Dr. Roberto Mercatelli e o Dr. Lauro Michielin eram desses homens, em que o amor ao bem e a causa da filantropia se constituíam na ideia central que norteava suas vidas: "fazer o bem, não importa a quem". Estavam agora envolvidos num grandioso projeto filantrópico, que ameaçava naufragar. A diretoria do Sanatório e demais membros do Grupo Espírita Sayão sempre demonstraram vivo interesse pela materialização do projeto da Universidade Espírita e agora, porém, todos concordavam que era necessário encontrar um novo norte: o momento exigia reflexão, o concurso de outros atores e de novos caminhos.

A percepção de que as portas do Conselho Federal de Educação estavam definitivamente fechadas e a possibilidade de obtenção de autorização de funcionamento para um curso de medicina praticamente nula, com custos para viabilização do projeto se tornando demasiado altos, fez com que se abrissem para uma nova possibilidade. A mesma ata de 02 de maio de 1973, de reunião de diretoria do Sanatório, registra a seguinte fala do Dr. Roberto: "Agora sabemos que, se no futuro, obtivermos solução favorável junto ao Conselho Federal de Educação, as condições serão altamente onerosas e praticamente inexequíveis para a nossa instituição, não considerando ainda os reflexos negativos em nosso idealismo cristão à luz da Doutrina Espírita. Para a sua viabilidade, teríamos que contar, o que nem sempre é possível e conveniente, com os recursos financeiros, técnicos e administrativos de terceiros, capazes de enfrentar, entre outras coisas, as despesas com construções e principalmente a manutenção do hospital-escola".

A nova possibilidade, decisivamente passava por uma reestruturação radical do projeto em andamento, e exigia o concurso de novos atores, novas fontes de receitas e definição de novos caminhos.

Conta o Dr. Hermínio que tão logo assumiu o cargo de prefeito municipal, no início daquele mesmo ano de 1973, o Prof. Jair Della Coletta o procurou. Ciente das dificuldades enfrentadas pelo Sanatório para viabilizar sua universidade e, apoiador incondicional da causa, o prefeito expôs a ele sua ideia de criação de uma fundação educacional municipal, com a inclusão do Sanatório e de outras forças locais, ampliação do patrimônio da instituição com investimento pesado público e privado, aumento do quadro de instituidores com a participação de outras personalidades da sociedade local e revisão dos procedimentos de solicitação e de aprovação dos cursos – não mais um curso de medicina, mas outros, das áreas das ciências biológicas, exatas e humanas, e obtenção dos registros e autorizações, agora junto ao Conselho Estadual de Educação – por se tratar de fundação pública – e não mais junto ao Conselho Federal, conforme determinação legal.

A mesma ata de 02 de maio de 1973 do Sanatório, ainda assinala a seguinte fala de seu presidente Dr. Roberto, aludindo à proposta do prefeito Jair: "Por outro lado, esboça-se em nossa cidade um movimento que visa trazer outras escolas de nível superior, contando, entre os seus idealizadores, a Prefeitura Municipal, a Família Ometto e outros grupos locais de notória projeção financeira e política. Os mesmos, pessoas e entidades idôneas e responsáveis, acabam de afirmar que, para levar avante esse "desideratum", torna-se necessária a adesão do Sanatório, que desistiria de pleitear a faculdade de medicina e, ao mesmo tempo, colaboraria com os bens então destinados àquele estabelecimento de ensino". E continua o Dr. Roberto: "Se apresenta ao Sanatório uma solução: se de um lado, desistimos da faculdade de medicina, por outro, contribuiremos para trazer outras escolas também de nível superior, menos difíceis de ser conseguidas e praticamente não deficitárias".

Com a anuência de todos, um novo desenho tomou forma: a futura Fundação Regional do Ensino Superior em Araras iniciaria atividades com as faculdades de Ciências Biológicas e de Engenharia Química, e contaria com investimentos municipais: 5% do orçamento municipal já no ano seguinte – 1974; 7% no ano de 1975; e 9% no ano de 1976 e, nos exercícios seguintes, 9% a cada ano. E também, com investimentos privados, por conta de aportes financeiros bancados por diversas empresas ararenses.

Em 02 de julho de 1973, a Câmara Municipal aprovou lei autorizando a criação de uma fundação pública, a Fundação Regional do Ensino Superior em Araras e, em 10 de julho daquele ano, os conselheiros designados pelo senhor prefeito municipal, reunidos em assembleia, elegem o Dr. Hermínio Ometto presidente da fundação, sendo vice-presidentes os senhores Dr. Roberto Mercatelli e Prof. Jair Della Coletta. Na composição do primeiro conselho superior, constam os nomes do Dr. Lauro Michielin e de seu irmão Sr. Laerte Michielin, que posteriormente presidiu a fundação.

Dr. Lauro redigiu os estatutos da Fundação recém-criada, e é possível notar a total identidade de propósitos das duas instituições: a Associação Educacional, Hospitalar e Assistencial de Araras e a Fundação Regional do Ensino Superior em Araras. Em outras palavras, a Associação Educacional teve na Fundação Regional de Ensino Superior em Araras a continuação natural de seus ideais. O Conselho Estadual de Educação aprovou a criação da Faculdade de Ciências Biológicas e dos cursos de Biologia e Biomedicina, em 22 de maio de 1974, e no ano seguinte iniciaram-se as atividades acadêmicas.

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